Motoristas Terceirizados e o Risco de Vínculo CLT

Terceirizar motoristas não elimina o risco de vínculo CLT. Veja como evitar passivos trabalhistas em frotas contratadas para transporte corporativo.

TRABALHISTA EMPRESARIAL

TMC

3/26/20253 min read

Recentemente, ao atender uma empresa de distribuição de alimentos, revisei os contratos com motoristas terceirizados que atuavam na entrega em cinco estados. A empresa acreditava estar protegida, pois não contratava diretamente, mas via transportadoras. Porém, alguns motoristas usavam uniformes da marca, seguiam rotas definidas pelo supervisor logístico interno, e tinham metas diárias de entregas.

Em um dos casos, um motorista acionou a Justiça do Trabalho e teve vínculo reconhecido diretamente com a contratante, mesmo havendo um CNPJ intermediário. A decisão judicial foi clara:

“A terceirização foi ilícita ao extrapolar os limites da autonomia operacional.”

Terceirização é permitida. Mas tem limites.

Desde a reforma trabalhista de 2017, a terceirização de qualquer atividade é legal no Brasil, inclusive atividades-fim. Porém, para ser legítima, ela deve respeitar os seguintes critérios:

  • A contratada deve possuir autonomia operacional e administrativa;

  • Os funcionários da terceirizada não podem ser subordinados diretos da contratante;

  • A contratante não pode controlar a jornada ou dar ordens diretas;

  • Equipamentos, fardamento e veículos devem ser próprios da terceirizada, ou contratados de forma clara.

Se esses requisitos são desrespeitados, o que era terceirização vira intermediação ilícita de mão de obra — e o vínculo com a empresa contratante pode ser reconhecido judicialmente.

Quando o vínculo direto é reconhecido com o tomador?

Isso acontece, por exemplo, quando:

  • O motorista recebe ordens diretas de supervisores da empresa contratante;

  • A contratante define rotas, horários e metas diretamente com o motorista;

  • A empresa exige uso de uniforme com sua marca, criando imagem de vínculo;

  • O controle de jornada é feito pelo sistema interno da contratante;

  • A contratada é uma empresa de fachada, com estrutura mínima.

Ou seja, quando a subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade são claramente visíveis — mesmo que o contrato formal diga o contrário.

Por que o risco é maior com motoristas?

O transporte envolve atividades externas, rotinas repetitivas e exposição a metas rígidas. Frequentemente, as empresas:

  • Integram os motoristas a sistemas internos (ERP, aplicativos logísticos);

  • Exigem check-ins, confirmação de entregas e feedbacks em tempo real;

  • Estabelecem regras internas que valem também para os terceirizados.

Essa integração operacional, se não for muito bem gerida, confunde os limites entre autonomia e subordinação — e o risco jurídico explode.

Qual o passivo trabalhista pode surgir?

Se um motorista terceirizado consegue na Justiça o reconhecimento de vínculo, a empresa pode ser condenada a:

  • Registrar retroativamente o vínculo em carteira;

  • Pagar férias, 13º, FGTS, INSS e horas extras;

  • Arcar com indenização por demissão sem justa causa;

  • Responder solidariamente com a terceirizada, ou até isoladamente, se houver fraude.

O impacto pode atingir toda a frota, se for identificada uma prática reiterada. E mais: em casos graves, pode haver enquadramento como terceirização fraudulenta, com repercussões administrativas e fiscais.

Como evitar o risco de vínculo empregatício?

  1. Contrate empresas terceirizadas com estrutura real: frota própria, sede, colaboradores registrados;

  2. Não interfira na operação: não passe ordens diretas aos motoristas;

  3. Formalize bem o contrato de prestação de serviços, com cláusulas sobre autonomia;

  4. Evite uniformes, crachás e símbolos da sua empresa nos veículos da terceirizada;

  5. Mantenha o contato operacional com um gestor da empresa contratada, e não diretamente com os motoristas;

  6. Fiscalize o cumprimento da lei trabalhista pela terceirizada (registro, jornada, EPI, seguros).

E se o motorista estiver vinculado a uma cooperativa?

O uso de cooperativas de trabalho pode ser uma alternativa legítima — desde que seja uma cooperativa verdadeira, com autonomia organizacional, assembleias, e sem subordinação.

O problema é que muitas “cooperativas” são disfarces para PJ simples, e não possuem estrutura coletiva real. Nesses casos, o Judiciário tende a desconsiderar a cooperativa e reconhecer vínculo direto com a tomadora.

O que diz a jurisprudência?

Tribunais do trabalho em todo o país já condenaram empresas contratantes que ultrapassaram os limites da terceirização. Em decisões recentes:

  • Uma distribuidora foi condenada a pagar R$ 220 mil a um motorista que usava crachá da marca e recebia ordens por WhatsApp de gestor interno;

  • Uma rede de farmácias teve de recontratar motoristas de app como empregados após decisão que reconheceu vínculo por subordinação estrutural.

O entendimento é cada vez mais claro: não basta formalizar — é preciso comprovar autonomia real.

Contratar transportadoras e motoristas terceirizados é uma prática comum e legal. Mas o que define a legalidade da relação não é o contrato — é a prática. E quando a prática mostra subordinação, o vínculo pode ser reconhecido com todas as consequências jurídicas.

Se sua empresa atua com logística terceirizada, é hora de revisar os contratos, alinhar as práticas operacionais e blindar sua operação. Crescimento com escalabilidade só é possível com segurança jurídica.

Se você já passou por situações semelhantes ou quer compartilhar boas práticas, escreva para contato@gestaolegal.com. Sua experiência pode ajudar outras empresas a evitarem erros caros e protegerem sua reputação.